As maçanetas retráteis, aquelas que ficam embutidas na carroceria do veículo, podem estar com os dias contados na China. As autoridades regulatórias do país estão considerando uma proibição desse sistema a partir de 2027, citando preocupações significativas com a segurança e deficiências funcionais que colocam os ocupantes em risco.

BYD SEALION 05 EV com maçanetas retráteis

Os riscos das maçanetas eletrônicas

O que parecia ser um avanço estético e tecnológico revelou-se uma potencial armadilha. As maçanetas totalmente retráteis mostraram falhas alarmantes em situações críticas. Dados do Índice de Segurança Automotiva de Seguros da China (C-IASI) são bastante reveladores: em testes de colisão lateral, veículos com maçanetas eletrônicas tiveram apenas 67% de sucesso na abertura das portas, enquanto os sistemas mecânicos tradicionais alcançaram 98%.

E não são apenas colisões que preocupam. Em 2024, durante fortes chuvas na cidade de Guangdong, muitas maçanetas eletrônicas sofreram curtos-circuitos que impediram completamente a abertura das portas. Passageiros precisaram quebrar janelas para escapar de seus veículos. Um cenário de pesadelo que ninguém espera enfrentar.

Problemas com maçanetas em situações de emergência

Impacto na indústria automotiva chinesa

Caso a medida seja implementada, a indústria automotiva chinesa enfrentará um desafio considerável. A maioria dos carros elétricos e híbridos plug-in do país adotou esse recurso, tornando-se quase uma característica padrão nos veículos premium. Um projeto de normas está em fase final e deve ser concluído ainda este mês, dando às montadoras um período de transição de um ano.

As novas regras preveem que a proibição entre em vigor até julho de 2027. Após essa data, os veículos novos vendidos na China não poderão mais contar com maçanetas totalmente retráteis como as conhecemos hoje.

Chery Tiggo 9 com sistema de maçanetas

Benefícios questionáveis e custos elevados

Mas afinal, por que tantos fabricantes adotaram esse sistema? A justificativa inicial era a aerodinâmica aprimorada. No entanto, cálculos de engenheiros revelam que a redução no coeficiente de arrasto é mínima, gerando uma economia de energia insignificante de cerca de 0,6 kWh a cada 100 km.

O peso dessas maçanetas – entre sete a oito quilogramas, devido aos motores e estruturas adicionais – praticamente anula qualquer ganho aerodinâmico. E o custo? Esses dispositivos seriam supostamente três vezes mais caros que os modelos mecânicos e têm uma taxa de falha oito vezes maior.

Uma fabricante chinesa relatou que 12% dos reparos de veículos novos estão relacionados a problemas nas maçanetas, muitas vezes exigindo substituição completa do conjunto. Um custo adicional que acaba sendo repassado aos consumidores.

GAC Aion Y e seu design com maçanetas retráteis

Buscando alternativas seguras

Algumas montadoras já começaram a buscar soluções intermediárias. A Audi, por exemplo, em modelos como A5L e Q6L e-tron, incorporou sistemas de emergência que liberam uma alça mecânica quando necessário. Essa abordagem híbrida mantém o visual moderno enquanto garante segurança em situações críticas.

O debate sobre segurança se ampliou para outras tendências de design automotivo. O Ministério da Indústria e Tecnologia da Informação (MIIT) da China revisa normas que envolvem substituição de botões físicos por telas sensíveis ao toque, espelhos digitais e tetos panorâmicos.

Audi Q6 e-tron com sistemas de segurança

A Euro NCAP já havia anunciado que, a partir de 2026, veículos que concentrem funções críticas como piscas, luzes de emergência, buzinas, limpadores de para-brisa e chamadas de emergência apenas em telas não receberão classificação máxima de segurança. Um movimento que sinaliza uma reconsideração global sobre o excesso de tecnologia em detrimento da segurança.

Dados do Sistema Nacional de Investigação Aprofundada de Acidentes (NAIS) mostram um aumento de 47% nos acidentes causados por falhas nas maçanetas das portas em 2024, com maçanetas escondidas sendo responsáveis por impressionantes 82% desses incidentes. Números que não podem ser ignorados.

O debate sobre funcionalidade versus estética

O que começou como uma busca por designs mais limpos e futuristas revelou-se uma armadilha perigosa. As montadoras pareciam mais preocupadas com a aparência do que com a funcionalidade básica. E não me entenda mal – eu adoro um carro bonito tanto quanto qualquer pessoa. Mas quando a forma compromete a segurança, algo está fundamentalmente errado.

Lembro-me de testar um veículo elétrico premium no ano passado. As maçanetas retráteis pareciam incríveis quando o carro estava parado, criando uma silhueta perfeita. Mas quando cheguei a um estacionamento apertado, precisei esperar vários segundos enquanto o sistema decidia se deveria liberar as portas. Uma experiência frustrante que me fez questionar: vale a pena sacrificar a praticidade por um visual supostamente mais moderno?

Zeekr Mix com portas deslizantes

Como outras regiões estão lidando com essa tendência

Enquanto a China avança com a possível proibição, outras regiões observam atentamente. A União Europeia, conhecida por suas rigorosas normas de segurança, ainda não tomou uma posição definitiva sobre o assunto. No entanto, conversas com engenheiros europeus revelam preocupações similares.

Um executivo de uma montadora alemã, que preferiu não se identificar, comentou: "Sabíamos dos riscos desde o início, mas o mercado exigia designs cada vez mais limpos. Agora, estamos correndo para desenvolver soluções que mantenham a estética sem comprometer a segurança".

Nos Estados Unidos, a NHTSA (Administração Nacional de Segurança no Tráfego Rodoviário) iniciou investigações preliminares após vários relatos de consumidores que enfrentaram dificuldades em situações de emergência. Diferente da China, porém, a abordagem americana tende a ser mais reativa do que preventiva.

O custo real para os consumidores

Muitos proprietários nem imaginam o pesadelo financeiro que essas maçanetas podem representar. Um amigo meu comprou um sedã elétrico de luxo no ano passado. Três meses depois, a maçaneta do passageiro parou de funcionar. O conserto? Quase R$ 8.000, porque a montadora exigiu a substituição completa do conjunto eletrônico.

E não é apenas o custo das peças. O tempo de inatividade do veículo é outro problema sério. Muitas concessionárias não mantêm essas peças complexas em estoque, obrigando os clientes a esperarem semanas por componentes vindos diretamente da China. Imagine ficar sem seu carro novo por um mês porque uma simples maçaneta quebrou.

Os dados de garantia são ainda mais alarmantes. Uma análise interna de uma grande rede de concessionárias mostrou que as maçanetas retráteis representam 18% de todas as reclamações durante o primeiro ano de uso. Um número absurdamente alto para um componente que deveria ser simples e confiável.

Inovações que podem substituir as maçanetas problemáticas

Algumas montadoras já estão explorando alternativas interessantes. A Nio, por exemplo, desenvolveu um sistema que combina sensores de toque com uma alça mecânica de emergência. Quando o carro detecta uma colisão ou falha elétrica, travas pirotécnicas liberam instantaneamente um mecanismo manual.

A Zeekr optou por uma abordagem completamente diferente em seu modelo Mix, usando portas deslizantes que eliminam completamente a necessidade de maçanetas externas. A solução é engenhosa, mas traz seus próprios desafios de custo e complexidade.

Outras empresas estão testando sistemas baseados em reconhecimento facial e sensores de proximidade que permitem a abertura sem contato físico. Tecnologicamente impressionante, mas será que conseguiremos confiar nossa segurança a algoritmos em situações críticas?

O que me preocupa é que muitas dessas "soluções" parecem apenas substituir um problema por outro. Em vez de simplificar, estamos adicionando camadas de complexidade que podem falhar de maneiras imprevisíveis. Às vezes, a melhor inovação é saber quando voltar ao básico.

O papel das certificações de segurança globais

As organizações de segurança veicular worldwide estão finalmente acordando para esse problema. A Euro NCAP já sinalizou que, a partir de 2026, penalizará veículos que dependem exclusivamente de sistemas eletrônicos para funções críticas de segurança. Mas será que isso é suficiente?

O que observo é uma desconexão entre os testes de laboratório e o mundo real. Os protocolos de colisão simulam condições ideais – baterias carregadas, sistemas funcionando perfeitamente. Mas e quando o carro está com a bateria fraca após ficar parado no aeroporto por duas semanas? Ou quando a eletrônica sofre danos por água durante uma enchente?

Um engenheiro de segurança automotiva me confessou recentemente: "Nossos testes não capturam adequadamente os cenários de falha em cascata que podem ocorrer em situações reais. Precisamos urgentemente atualizar nossos protocolos para refletir essas novas tecnologias".

Curiosamente, algumas montadoras parecem estar resistindo à tendência das maçanetas totalmente retráteis. A Volvo, sempre focada em segurança, manteve maçanetas convencionais em seu EX30, apesar de ser um veículo elétrico moderníssimo. A Tesla, por outro lado, continua defendendo ardentemente seu sistema de maçanetas retráteis, argumentando que as falhas iniciais foram resolvidas nas gerações mais recentes.

Dados do IIHS (Insurance Institute for Highway Safety) americano mostram que veículos com sistemas de abertura manual tradicional têm 34% menos probabilidade de apresentar problemas relacionados às portas durante a vida útil do veículo. números que falam por si só.

Com informações do: Quatro Rodas