O cenário dos hatches esportivos europeus perdeu um de seus principais protagonistas. A Ford encerrou oficialmente a produção do Focus ST na Alemanha, marcando o início do fim de uma linhagem que desafiou o Volkswagen Golf GTI por mais de duas décadas. A última unidade saiu da linha de produção em Saarlouis no final de setembro, deixando uma lacuna no segmento que poucos modelos conseguirão preencher.

O fim de uma era para os hatches esportivos

O que mais me impressiona nessa notícia é como ela representa uma mudança muito maior no mercado automotivo. A Ford está seguindo uma estratégia clara: abandonar completamente os carros de passeio tradicionais na Europa para focar apenas em SUVs e picapes. É uma decisão comercial compreensível, mas que deixa muitos entusiastas de coração partido.

Lembro-me de quando testei o Focus ST pela primeira vez - sua combinação de motor turbo potente com câmbio manual oferecia uma experiência de direção que poucos concorrentes conseguiam igualar. Na Europa, o modelo era equipado com um motor 2.3 turbo EcoBoost de quatro cilindros que entregava impressionantes 276 cv, sempre com tração dianteira e a opção de câmbio manual de seis marchas.

O que o mercado perde com a saída do Focus ST

Sem o Focus ST no páreo, a competição no segmento de hatches esportivos fica significativamente menos interessante. O Volkswagen Golf GTI perde seu rival mais direto, enquanto o Hyundai i30 N ganha mais espaço, mas também perde um benchmark importante para se comparar.

É curioso pensar que, enquanto a Ford abandona os hatches esportivos, a Volkswagen acaba de lançar o novo Golf GTI no Brasil. Parece que as estratégias das montadoras estão seguindo caminhos completamente opostos em diferentes mercados.

O que isso revela sobre o futuro da indústria

O desaparecimento do Focus ST não é um evento isolado. Ele segue o mesmo destino do Fiesta e antecipa o fim de toda a linha Focus em novembro. Na minha opinião, isso reflete uma transformação profunda na indústria automotiva, onde os SUVs dominam as preferências dos consumidores e os carros tradicionais com foco na dirigibilidade vão se tornando artigos de nicho.

O que me preocupa é que, com cada modelo esportivo acessível que desaparece, perdemos um pouco da diversidade e do prazer de dirigir que tornavam o mercado automotivo tão interessante. Resta saber se os elétricos conseguirão preencher esse vazio emocional ou se estamos testemunhando o fim de uma era que nunca mais voltará.

Para entender melhor o impacto dessa decisão, é importante olhar para os números. O Focus ST sempre foi um produto de nicho dentro da linha Ford, mas sua importância simbólica era enorme. Ele funcionava como uma espécie de carro-chefe tecnológico - muitas das inovações em motores e chassis que depois apareciam nos modelos mais populares eram testadas e refinadas primeiro nas versões ST. Sem esse laboratório sobre rodas, será que a Ford conseguirá manter o mesmo nível de desenvolvimento para seus futuros SUVs esportivos?

E não é só sobre performance. O Focus ST tinha uma personalidade única que conquistava até quem normalmente não se interessava por carros esportivos. Seu escapamento com estalidos característicos durante as trocas de marcha, os bancos Recaro que abraçavam o corpo sem sufocar, e aquela direção comunicativa que te mantinha conectado à estrada - tudo isso criava uma experiência que vai muito além de números em uma ficha técnica.

Interior do Ford Focus ST com bancos esportivos

O que os concorrentes farão com esse vácuo no mercado?

Sem a pressão competitiva do Focus ST, me pergunto se a Volkswagen poderá se acomodar com o Golf GTI. A rivalidade entre esses dois modelos sempre foi saudável para o consumidor - cada nova geração precisava trazer melhorias significativas para superar o adversário. Agora, com um dos principais competidores fora da jogada, será que a VW manterá o mesmo ímpeto inovador?

E olhando para outras marcas, a situação fica ainda mais interessante. A Hyundai, com seu i30 N, perde um benchmark crucial para desenvolvimento. O Honda Civic Type R fica mais isolado em seu nicho premium. Até mesmo modelos como o Cupra Leon podem sentir o efeito dominó - sem o Focus ST para puxar o nível técnico do segmento, todo o mercado de hatches esportivos pode sofrer uma estagnação.

É engraçado pensar que, há alguns anos, tínhamos opções como o Opel Astra OPC, o Renault Mégane RS e o Peugeot 308 GTI competindo nesse segmento. Hoje, a lista de sobreviventes está cada vez menor, e a saída do Focus ST acelera esse processo de forma preocupante.

O que os entusiastas podem esperar do futuro?

Muitos fãs do Focus ST estão se perguntando se vale a pena comprar uma unidade usada agora que a produção acabou. Na minha experiência, modelos descontinuados com forte apelo entre entusiastas tendem a se valorizar com o tempo, especialmente versões especiais ou com baixa quilometragem. Mas isso também significa que os preços de manutenção podem subir conforme as peças ficam mais escassas.

E quanto aos planos da Ford para preencher essa lacuna? Rumores sugerem que a marca pode desenvolver uma versão esportiva de algum SUV, mas será que um crossover alto e pesado pode realmente oferecer a mesma sensação de conexão com a estrada que um hatch baixo e ágil como o Focus ST? Tenho minhas dúvidas.

Ford Focus ST em curva demonstrando sua dirigibilidade

O que mais me preocupa nessa transição é que estamos perdendo não apenas um carro, mas toda uma filosofia de engenharia. O Focus ST representava uma abordagem específica para o desempenho - acessível, divertido no dia a dia, mas capaz de performances sérias quando necessário. Era o tipo de carro que você podia usar para ir ao supermercado e depois aproveitar uma estrada sinuosa no fim de semana.

Enquanto isso, no Brasil, a situação é ainda mais complexa. O Focus ST nunca foi oficialmente vendido aqui em sua última geração, então muitos entusiastas brasileiros já estavam acostumados a viver sem ele. Mas sua ausência no mercado global afeta indiretamente até nós - influencia o que as montadoras decidem desenvolver e comercializar mundialmente.

E pensar que há dez anos o segmento de hatches esportivos vivia seu auge, com lançamentos constantes e evoluções técnicas significativas a cada nova geração. Hoje, parece que estamos assistindo a um lento desaparecimento de uma categoria que já foi o coração do mercado automotivo europeu. O que será que isso diz sobre nossas prioridades como sociedade? Estamos realmente preferindo conforto e praticidade acima do prazer de dirigir?

Com informações do: Quatro Rodas