Andrzej Sapkowski, o autor polonês que deu vida ao universo de The Witcher, expressou opiniões contundentes sobre como suas obras foram adaptadas para os videogames. Em declarações recentes, ele criticou especificamente a inclusão das escolas de bruxos, como a Escola do Lobo, considerando-as elementos desnecessários que distorcem sua visão original.

As críticas do autor às adaptações

Sapkowski não mediu palavras ao descrever a Escola do Lobo como "indigna de desenvolvimento" e "narrativamente incorreta". Ele chegou ao ponto de considerar a possibilidade de remover completamente essas escolas do cânone oficial de sua obra. O que me surpreende é como um elemento tão central nos games pode ser visto como tão problemático pelo próprio criador do universo.

Essa não é a primeira vez que o autor expressa descontentamento com as adaptações de sua obra. Sapkowski tem histórico de relações complicadas com a CD Projekt Red, desenvolvedora dos games, embora tenha eventualmente chegado a acordos financeiros. A tensão entre a visão original do autor e as necessidades de gameplay sempre foi um ponto delicado nas adaptações.

O conflito entre literatura e interatividade

Nos livros, a formação dos bruxos é tratada de maneira bastante diferente. As escolas são mencionadas, mas não recebem o mesmo nível de detalhamento e importância que nos games. A CD Projekt Red expandiu significativamente esse conceito, transformando-as em elementos centrais da jogabilidade e da customização do personagem.

E aqui está o cerne da questão: o que funciona na literatura nem sempre se traduz bem para a interatividade dos videogames. As escolas de bruxos nos games servem a um propósito prático - oferecem ao jogador um senso de identidade, pertencimento e progressão. Mas será que essa expansão criativa traiu a visão original de Sapkowski?

Implicações para o futuro da franquia

Essas declarações surgem em um momento crucial para a franquia. Com novos projetos em desenvolvimento, incluindo outro game da saga sem a participação da CD Projekt Red, a questão do cânone se torna ainda mais relevante. Se Sapkowski realmente decidir remover as escolas do cânone oficial, como isso afetaria futuras adaptações?

O que observo é um fenômeno comum quando obras literárias são adaptadas para outras mídias: o equilíbrio entre fidelidade à fonte original e as necessidades do novo meio. Nos games, elementos como as escolas de bruxos ajudam a criar sistemas de progressão que engajam os jogadores - algo que simplesmente não existe nos livros.

Talvez o maior desafio seja reconciliar duas visões artísticas diferentes: a do autor que criou o universo e a dos desenvolvedores que o transformaram em uma experiência interativa. Ambas têm méritos, mas também limitações impostas por suas respectivas mídias.

O papel das escolas nos games versus nos livros

Quando você para para pensar, as escolas de bruxos nos games cumprem uma função que vai muito além do que Sapkowski imaginou. Nos livros, a formação de Geralt é mencionada de passagem - sabemos que ele treinou em Kaer Morhen, que passou por mutações, mas os detalhes são escassos. Já nos games, a Escola do Lobo se torna quase um personagem por si só, com sua arquitetura imponente, seus fantasmas do passado e seu papel como refúgio.

E cá entre nós, quantos jogadores não se sentiram genuinamente em casa ao retornar a Kaer Morhen após horas de aventura? Essa sensação de pertencimento é algo que os games conseguem criar de maneira única, através da exploração e da interação com o espaço. Nos livros, Kaer Morhen é pouco mais que um pano de fundo; nos games, é um lar.

O que me intriga é como essa expansão criativa reflete necessidades diferentes de cada mídia. Enquanto a literatura pode se dar ao luxo de manter certos elementos nebulosos, os videogames - especialmente os RPGs - precisam de sistemas concretos, de progressão mensurável, de customização visual. As escolas oferecem tudo isso: diferentes armaduras, habilidades especiais, até mesmo estéticas distintas para os bruxos.

Kaer Morhen em The Witcher 3: Wild Hunt

As consequências práticas da remoção do cânone

Se Sapkowski realmente levar adiante sua ameaça de remover as escolas do cânone oficial, as implicações seriam interessantes - para não dizer complicadas. Por um lado, ele tem todo o direito de definir o que é ou não canônico em seu próprio universo. Por outro, as escolas já estão tão entranhadas na cultura popular que seria como tentar desinventar a roda.

Imagine só: futuras adaptações teriam que ignorar completamente um elemento que se tornou central para a identidade visual e narrativa dos games. Os fãs que conheceram a franquia através dos jogos ficariam confusos, e os desenvolvedores teriam que criar sistemas alternativos de progressão que cumprissem a mesma função sem infringir o cânone.

Na minha experiência acompanhando adaptações, raramente vi um criador original ser tão vocal sobre elementos específicos que foram adicionados em outras mídias. Normalmente as críticas são mais amplas, sobre tom geral ou fidelidade à essência da obra. A especificidade da crítica de Sapkowski é o que mais chama atenção - ele não está apenas reclamando da adaptação como um todo, mas atacando um conceito particular que os fãs dos games abraçaram.

E isso me faz pensar: até que ponto um autor mantém controle sobre sua criação depois que ela se torna um fenômeno cultural? Quando uma obra transcende seu meio original e se espalha por games, séries, merchandise - ela ainda pertence exclusivamente ao criador, ou passa a ser propriedade coletiva da cultura?

O impacto nas relações criativas

O que mais me preocupa nessas declarações é o potencial impacto nas relações entre autores e adaptadores. Sapkowski já teve seus atritos públicos com a CD Projekt Red, incluindo disputas por royalties que eventualmente foram resolvidas. Mas esse tipo de crítica pública pode criar um ambiente onde outros autores fiquem receosos de permitir adaptações, ou onde desenvolvedores se sintam desencorajados a expandir universos literários.

É frustrante quando se vê essa falta de reconhecimento pelo trabalho que transformou The Witcher de uma série de livros relativamente nichada na Polônia em um fenômeno global. Sem os games, será que teríamos a série da Netflix? Os spin-offs? O reconhecimento mundial que Sapkowski hoje desfruta?

Mas, ao mesmo tempo, entendo a frustração do autor. Ver elementos que você considera secundários - ou até desnecessários - se tornarem centrais na percepção pública da sua obra deve ser desconcertante. É como se as pessoas estivessem celebrando aspectos que você nunca considerou importantes.

O que observo aqui é um conflito fundamental sobre o que significa ser fiel a uma obra. Para Sapkowski, fidelidade significa aderir estritamente aos elementos que ele considerou importantes. Para os adaptadores, fidelidade pode significar capturar o espírito da obra enquanto a adapta para um meio diferente, com suas próprias necessidades e convenções.

E você, o que acha? As escolas de bruxos realmente distorcem a visão original de Sapkowski, ou são uma adição válida que enriquece o universo? Será que os criadores deveriam ter mais flexibilidade ao ver suas obras adaptadas para outros meios?

O timing dessas declarações é particularmente interessante considerando os rumores sobre o próximo game de The Witcher. Dizem que será uma reinvenção da franquia, possivelmente sem Geralt como protagonista. Se Sapkowski realmente remover as escolas do cânone, como isso afetaria o design desse novo projeto? Os desenvolvedores teriam que criar um sistema completamente novo de progressão e identidade para os bruxos.

Às vezes me pergunto se parte da resistência de Sapkowski vem do fato de que, nos livros, os bruxos são uma instituição em declínio, quase extinta, enquanto nos games eles recuperam uma certa relevância através das escolas. Essa revitalização pode contradizer sua visão original de um mundo onde a magia e os monstros estão dando lugar à tecnologia e à razão.

Com informações do: IGN Brasil