Uma disputa publicitária entre duas gigantes automotivas resultou na suspensão de campanhas de marketing no Brasil. O Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) decidiu, por unanimidade, sustar uma série de propagandas da BYD que faziam comparações diretas e indiretas com o Volkswagen Polo, reacendendo o debate sobre os limites da publicidade comparativa no setor automotivo.

A decisão do Conar e as campanhas questionadas

Em reunião realizada no dia 18 de novembro, o Conselho de Ética do Conar analisou representações contra campanhas publicitárias da BYD e determinou a sustação "agravada por advertência" de várias peças que comparavam o Dolphin Mini com o VW Polo. A decisão abrange desde anúncios que mencionavam especificamente o concorrente até versões mais criativas que usavam recursos sonoros e imagens do esporte polo para contornar advertências anteriores.

O que me surpreende nesta história é como a BYD tentou contornar as regras de forma bastante criativa. Após receber uma advertência por citar diretamente o concorrente, a empresa chinesa desenvolveu uma campanha alternativa que substituía o nome "Polo" por um bip sonoro e incluía cenas de partidas do esporte polo - aquele jogado com cavalos, tacos e uma bola pequena. Uma jogada inteligente, mas que claramente não convenceu os membros do conselho de ética.

As alegações que causaram polêmica

As campanhas suspensas incluíam afirmações bastante específicas sobre vantagens competitivas da BYD em relação à Volkswagen. Entre as mensagens questionadas estavam: "Reposição de peças 50% mais rápida que os concorrentes", "A desvalorização do BYD Dolphin foi 60% menor que a do carro mais vendido do varejo, o Volkswagen Polo" e declarações sobre a marca ser "Nº 1 em satisfação no Brasil".

Na minha experiência acompanhando o mercado automotivo, vejo que esse tipo de comparação direta tem se tornado mais comum conforme as marcas chinesas ganham espaço no Brasil. Mas até que ponto essas alegações podem ser comprovadas? E qual o impacto real dessas campanhas na percepção dos consumidores?

É interessante notar que, quando procurada para comentar o caso, a BYD optou pelo silêncio, declarando apenas que "não vai comentar o assunto". Uma postura que, francamente, me faz pensar que a empresa reconhece a fragilidade de sua posição perante as normas do Conar.

O papel do Conar e a autorregulamentação publicitária

Muitos consumidores podem não conhecer bem o funcionamento do Conar, que é uma organização não governamental financiada por agências de publicidade, empresas anunciantes e veículos de comunicação. Seu Conselho de Ética avalia se propagandas denunciadas por consumidores ferem as questões éticas dispostas no Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária.

O que talvez seja menos conhecido é que o Conar não tem poder de censura propriamente dito. No entanto - e isso é crucial - suas decisões "são rigorosamente respeitadas pelos veículos de comunicação, que não voltam a exibir um anúncio que é suspenso". Na prática, isso significa que uma determinação do Conar tem praticamente o mesmo efeito de uma proibição legal.

Vale mencionar que nem todas as representações contra a BYD foram acatadas pelo Conar. Em 6 de novembro, outra denúncia contra a marca chinesa foi arquivada, demonstrando que o conselho avalia caso a caso e nem sempre decide contra os anunciantes.

Esta disputa entre BYD e Volkswagen ocorre em um momento particularmente sensível para o mercado automotivo brasileiro, com as marcas chinesas conquistando espaço rapidamente e as tradicionais precisando se adaptar a uma nova realidade competitiva. A agressividade das campanhas publicitárias reflete, em grande medida, a intensidade dessa batalha por market share.

O que me preocupa, como observador do setor, é que essas disputas publicitárias possam se intensificar ainda mais, levando a um ambiente de marketing cada vez mais agressivo. Será que os consumidores realmente se beneficiam com esse tipo de comparação? Ou acabam ficando mais confusos com alegações e contra-alegações?

O impacto no consumidor e no mercado automotivo brasileiro

Enquanto as gigantes automotivas travam suas batalhas publicitárias, fico me perguntando: como o consumidor comum processa toda essa informação? Na prática, essas campanhas comparativas criam um ruído considerável no processo de decisão de compra. Imagine alguém que está pesquisando seu primeiro carro e se depara com alegações de desvalorização 60% menores de um lado e, do outro, a tradição e reconhecimento de marca de uma montadora estabelecida há décadas no país.

O que observo no mercado atual é uma espécie de transição geracional na preferência dos compradores brasileiros. Enquanto consumidores mais velhos tendem a valorizar a história e a rede de concessionárias das marcas tradicionais, os mais jovens parecem mais abertos a experimentar as novidades tecnológicas e os preços competitivos oferecidos pelas chinesas. E essa divisão etária, claro, reflete diretamente nas estratégias de marketing adotadas por cada montadora.

Aliás, você já parou para pensar como essa disputa vai além das salas de reunião do Conar? As concessionárias se tornam palco dessas batalhas, com vendedores usando argumentos que muitas vezes ecoam as campanhas publicitárias contestadas. É comum ouvir relatos de que representantes da BYD mencionam explicitamente a comparação com o Polo durante o processo de vendas, mesmo após as determinações do conselho de ética.

Comparação entre BYD Dolphin Mini e VW Polo

O precedente legal e as implicações futuras

Esta não é a primeira vez que o Conar se pronuncia sobre publicidade comparativa no setor automotivo, mas certamente estabelece um precedente importante para casos futuros. O que me chamou atenção foi a forma como a BYD tentou contornar as advertências iniciais - essa tentativa de usar recursos sonoros e referências ao esporte polo demonstra uma criatividade que, francamente, beira a má-fé publicitária.

O mercado automotivo brasileiro vive um momento de transformação profunda, com as marcas chinesas conquistando participação a passos largos. Dados recentes mostram que a BYD já ultrapassou a Volkswagen em vendas em alguns meses específicos, o que ajuda a explicar a agressividade das campanhas. Quando você está ganhando terreno rapidamente, existe uma tentação natural de destacar essas conquistas de forma mais enfática - às vezes, talvez, indo além dos limites éticos.

Mas e as outras montadoras? Como ficam nessa história? Conversando com profissionais do setor, percebo que há um certo receio de que essa disputa BYD-Volkswagen possa abrir precedentes para ações semelhantes contra outras marcas. Se o Conar estabelece um padrão mais rigoroso para comparações, isso pode afetar todo o mercado, inclusive as campanhas que tradicionalmente usam termos como "melhor da categoria" ou "líder de segmento".

O que me preocupa é que, em algum momento, essa guerra publicitária pode migrar para outras esferas. Já imaginou se começam a surgir ações judiciais buscindo indenizações por propaganda enganosa? O caso poderia sair da autorregulamentação e entrar no campo legal, o que complicaria ainda mais o cenário para todas as envolvidas.

A resposta das montadoras e as estratégias de marketing

Enquanto a BYD mantém silêncio sobre o caso, a Volkswagen adotou uma postura interessante: em vez de se pronunciar publicamente sobre a disputa, focou em reforçar os atributos do Polo em suas próprias campanhas. É uma estratégia que, na minha avaliação, demonstra certa maturidade de marca - afinal, quem tem história consolidada no mercado pode se dar ao luxo de não entrar em every disputa publicitária.

Por outro lado, não podemos ignorar que a Volkswagen tem seus próprios desafios. O Polo, que já foi incontestável líder de vendas, agora enfrenta uma concorrência muito mais diversificada e agressiva. E quando uma marca percebe que está perdendo espaço, a tentação de reagir com igual intensidade é grande - muito grande.

O que observo nas redes sociais e fóruns especializados é que os consumidores estão divididos. De um lado, os defensores das marcas tradicionais argumentam que a rede de concessionárias, a disponibilidade de peças e o know-how das montadoras estabelecidas têm valor inestimável. Do outro, os entusiastas das chinesas destacam a tecnologia, o custo-benefício e a ousadia das novas players.

E as outras marcas chinesas? Acho curioso como a Great Wall, a CAOA Chery e outras estão acompanhando de perto esse embate. Dependendo do desfecho, elas podem ajustar suas próprias estratégias de marketing - seja intensificando as comparações diretas se o Conar afrouxar, ou buscando abordagens mais sutis se as regras se tornarem mais rigorosas.

Na prática, essa disputa entre BYD e Volkswagen representa muito mais do que uma simples questão publicitária. Ela simboliza a transição que o mercado automotivo brasileiro está enfrentando, com novas tecnologias, novos players e novas formas de se comunicar com o consumidor. E algo me diz que essa história está longe de terminar - na verdade, provavelmente é apenas o primeiro capítulo de uma série de conflitos que moldarão o futuro da indústria automotiva no Brasil.

Com informações do: Quatro Rodas