O cenário automotivo brasileiro está passando por uma transformação sem precedentes nas últimas semanas. Com a chegada de seis novas marcas de origem chinesa, o mercado nacional ganha opções que vão desde SUVs elétricos e híbridos até um conversível esportivo de alta performance. Cinco dessas marcas estão presentes no Salão do Automóvel de São Paulo, demonstrando a estratégia agressiva de expansão das fabricantes chinesas no Brasil. O que isso significa para os consumidores e para a indústria automotiva tradicional?

Jetour T2

Jetour: Robustez e tecnologia em SUV híbrido

Pertencente ao grupo Chery, a Jetour prepara sua estreia no Brasil de forma independente, separada da operação da CAOA ou da Omoda&Jaecoo. A marca promete seis modelos híbridos plug-in (PHEV) em um primeiro momento, todos com lançamento escalonado a partir de 2026. O destaque inicial é o Jetour T2, utilitário de visual robusto e linhas quadradas, preparado para enfrentar rivais como o GWM Tank 300.

O conjunto mecânico combina um motor 1.5 turbo a gasolina de 128 cv com dois motores elétricos, que juntos entregam 225 cv e 39,8 kgfm de torque. A bateria de 26,7 kWh permite rodar no modo elétrico por boas distâncias urbanas, e o câmbio híbrido de três marchas (DHT) gerencia o sistema de forma inteligente. Ainda não há preços confirmados, mas a marca já anunciou sete anos de garantia para o veículo e oito para o sistema elétrico.

Jetour T2 interior

No interior, o SUV é generoso em tecnologia: tela central de 15,6 polegadas com processador Snapdragon, painel digital de 10,25", som premium Sony e até 10 airbags. A Jetour pretende iniciar as vendas com 40 concessionárias e já montou um centro de distribuição de peças em Cajamar (SP). O primeiro lote, com 1.500 unidades, chega em dezembro de 2025. A marca também prepara motores adaptados ao etanol, numa tentativa de se aproximar ainda mais do perfil brasileiro.

Leapmotor: Tecnologia REEV com apoio da Stellantis

Leapmotor C10 REEV

A Leapmotor chega ao Brasil como parte do portfólio da Stellantis. Fundada em 2015 como uma startup, a montadora aposta em SUVs elétricos e híbridos de alcance estendido (REEV). O C10 é o primeiro a desembarcar, enquanto o B10 chega em janeiro.

Os preços variam de R$ 172.990 a R$ 199.990, dependendo da motorização. O C10 pode ser elétrico (218 cv e com bateria de 69,9 kWh) ou híbrido do tipo REEV (215 cv e 28,4 kWh), este último com um motor a gasolina que gera energia, mas não traciona o carro — como no antigo BMW i3. A autonomia chega até 950 km, segundo o ciclo europeu.

Leapmotor B10

O SUV aposta em um interior minimalista, dominado por uma tela de 14,6 polegadas e acabamento limpo, sem botões físicos. Na prática, o C10 mostra bom desempenho: 0 a 100 km/h em 8,2 segundos, suspensão confortável e isolamento acústico. A Leapmotor começa com 36 concessionárias, todas operadas dentro da rede Stellantis.

Durante o Salão do Automóvel, a marca confirmou que, a partir de 2026, terá veículos montados no Brasil na fábrica da Stellantis, em Goiana (PE). A produção começará por meio de kits, ainda sem definição entre CKD ou SKD, mas com a meta de ampliar a nacionalização ao máximo. A tecnologia REEV da Leapmotor também poderá ganhar versão flex com a estreia da plataforma Bio-Hybrid.

MG: Retorno com identidade sino-britânica e performance

MG4 XPower 2026

Fundada em 1924 e hoje pertencente à SAIC Motor, a MG está retornando ao Brasil com identidade sino-britânica: a SAIC é sua proprietária desde 2009. A marca aposta em três modelos elétricos: o hatch MG4, o SUV S5 e o esportivo conversível Cyberster, que entrega 510 cv e chega por R$ 499.800.

A MG Motor mal chegou ao Brasil e já ampliou sua linha elétrica no Salão do Automóvel de São Paulo, lançando versões mais acessíveis do MG4 e do MG S5 com preços promocionais até 30 de novembro. O MG4 agora parte de R$ 169.600 e o S5, de R$ 195.800.

MG MGS5 Luxury

O MG4 estreia as versões Comfort e Luxury com motor traseiro de 204 cv, 35,7 kgfm e autonomia de 279 km, além de recarga rápida de até 140 kW. A Comfort traz quadro digital de 10,25", multimídia de 12,8", câmera 360° e sensores traseiros, enquanto a Luxury adiciona itens semiautônomos e banco elétrico.

A MG mantém no catálogo a esportiva X-Power, com 435 cv e aceleração de 0 a 100 km/h em 3,8 segundos. Já o S5 segue a mesma lógica: a Comfort preserva itens como câmera 360° e multimídia de 12,8", mas perde teto panorâmico, carregamento sem fio e sistemas avançados; a Luxury inclui sete airbags e acabamento superior. Todas as versões usam motor traseiro de 205 cv, com aceleração de 0 a 100 km/h em 6,3 segundos e bateria de 62 kWh para 351 km de autonomia.

A operação começa com 24 concessionárias, mas a meta é chegar a 70 pontos de venda até 2026. A MG oferece ainda carregadores domésticos gratuitos e taxa zero no lançamento, sinal de que pretende se consolidar rapidamente no segmento de elétricos premium.

Changan, Avatr e Denza: Luxo e inovação radical

Avatr 12

A Caoa Changan fez sua estreia oficial no Salão do Automóvel de São Paulo com duas marcas de uma vez. Isso porque a Changan também é dona da Avatr, representada no evento pelos elétricos de luxo Avatr 12 e Avatr 11. A nova operação do grupo brasileiro, agora independente da Hyundai e em paralelo à Caoa Chery, começa mirando no segmento premium com a divisão de luxo da fabricante chinesa.

A Changan havia atuado como Chana entre 2006 e 2016 e volta ao país com uma estratégia semelhante à aplicada à Chery: rede ampla, produtos bem equipados e marketing agressivo.

Caoa Changan EO7

O Avatr 11 é o primeiro carro com lançamento no Brasil confirmado. Trata-se de um SUV cupê de presença marcante, com 4,90 m de comprimento e 2,98 m de entre-eixos, rivalizando em porte com modelos como o BMW X6. A versão exposta trazia dois motores elétricos e tração integral, somando 546 cv e 70 kgfm, capazes de levar o utilitário de quase 2,5 toneladas de 0 a 100 km/h em 3,9 segundos. A autonomia, medida pelo ciclo chinês CLTC, chega a 760 km.

Ao lado dele, o Avatr 12 ficou responsável por reforçar a imagem tecnológica da marca, atuando como um liftback elétrico mais baixo, com foco em personalização e refinamento.

Outra atração é o Caoa Changan EO7, um SUV que pode se transformar em picape por meio da abertura elétrica da caçamba, revestida por um vidro. É elétrica e está no Brasil apenas para demonstração, pois poderia enfrentar problemas de homologação por causa da ambiguidade da sua carroceria — que implica até mesmo na alíquota de impostos que teria que pagar.

Denza B5

Assim como muitas das marcas dessa lista, a Denza foi introduzida ao mercado brasileiro na semana passada. É uma marca de luxo da BYD para competir com Audi, BMW, Mercedes-Benz, Volvo e Land Rover. As vendas começam ainda em novembro, com uma expansão gradual de concessionárias até 2026. A estratégia é agressiva, mas a marca afirma que não busca volume e operará de forma independente da BYD, com rede própria e posicionamento exclusivo.

O primeiro modelo da marca será o Denza B5 2026, um SUV híbrido plug-in com aptidão off-road e desempenho de esportivo, que custa R$ 436.000. A arquitetura DMO, a mesma da picape Shark, combina um motor 1.5 turbo com dois motores elétricos que entregam 677 cv e 77,5 kgfm. A bateria Blade de 31,8 kWh garante entre 80 e 90 km de autonomia elétrica, enquanto o conjunto total pode chegar a 1.200 km. Mesmo sendo um SUV de chassi, acelera de 0 a 100 km/h em 4,8 segundos.

Denza Z9GT

O desenho segue a linha quadrada e imponente dos modelos off-road de luxo, com 4,89 m de comprimento, 1,97 m de largura e 1,92 m de altura. A cabine acompanha a proposta premium, com bancos de couro com ventilação, aquecimento e massagem, compartimento térmico, suspensão ativa com variação de até 14 cm e telas de 12,3" para o passageiro, além de central de 15,6" e head-up display de 50".

Quem deve roubar a cena no Salão é o Denza Z9GT, que começará a ser vendido em 2026 por R$ 650.000. O shooting brake de 5,23 m terá cinco telas dianteiras e quatro atrás, som com sistema premium, refrigerador e autonomia de 630 km no ciclo CLTC, graças aos três motores elétricos que somam 951 cv.

Para completar o trio chega o D9, uma van de luxo de R$ 800.000, com 5,25 m de comprimento e até sete telas, tem versões de 312 cv ou 374 cv e bateria de 103 kWh, com autonomia entre 600 km e 620 km. A cabine é pensada para conforto executivo, com bancos individuais, carregamento por indução de 50 W e câmeras internas que permitem videoconferências ou monitoramento dos passageiros. O modelo chega ao Brasil no segundo semestre de 2026.

O que significa essa invasão chinesa para o mercado brasileiro?

Com tantas marcas chegando quase simultaneamente, é natural se perguntar: como o mercado vai absorver tanta novidade? A verdade é que estamos testemunhando uma mudança tectônica na indústria automotiva brasileira. As montadoras tradicionais, que por décadas dominaram o cenário nacional, agora enfrentam concorrentes que chegam com tecnologia de ponta, preços competitivos e estratégias agressivas de expansão.

E não se trata apenas de mais opções para o consumidor. A chegada dessas marcas está forçando todo o setor a se repensar. De repente, recursos que antes eram exclusivos de veículos premium estão se tornando padrão em modelos de entrada. Tela central gigante? Já virou commodity. Sistema híbrido plug-in? Cada vez mais acessível. Garantia estendida? Virou diferencial competitivo.

Interior tecnológico dos novos modelos chineses

O que mais me impressiona é a velocidade com que essas marcas estão se adaptando ao mercado brasileiro. Muitas já anunciam desenvolvimento de motores flex para seus híbridos, algo que as montadoras tradicionais demoraram anos para implementar. A Leapmotor, por exemplo, já fala em plataforma Bio-Hybrid para 2026. É como se elas tivessem aprendido com os erros das primeiras tentativas de expansão internacional e chegassem com uma estratégia mais madura.

Infraestrutura e pós-venda: o grande desafio

Mas nem tudo são flores. A expansão rápida traz seus próprios problemas. Como garantir uma rede de concessionárias e assistência técnica que acompanhe o crescimento das vendas? A MG começa com 24 concessionárias, a Leapmotor com 36, a Jetour com 40. São números impressionantes para marcas que mal chegaram, mas será suficiente para um país continental como o Brasil?

E tem a questão das peças de reposição. A Jetour montou um centro de distribuição em Cajamar, mas e as outras marcas? O consumidor brasileiro já está acostumado com a ampla rede das montadoras tradicionais. Uma falha no pós-venda pode manchar a imagem dessas novas concorrentes antes mesmo que consigam se estabelecer.

Rede de concessionárias em expansão

Outro ponto crucial: a infraestrutura de recarga para os elétricos. Enquanto na China existem estações de recarga em praticamente todos os cantos, o Brasil ainda engatinha nesse aspecto. As marcas estão tentando contornar isso oferecendo carregadores domésticos gratuitos, como a MG, mas isso resolve apenas parte do problema. Quem vai fazer uma viagem mais longa ainda precisa contar com uma rede pública que, francamente, ainda é insuficiente.

E não podemos esquecer da adaptação dos veículos às nossas condições de estrada. As ruas brasileiras são conhecidas por seus buracos, lombadas e asfalto irregular. Será que a suspensão desses modelos, desenvolvidos para as estradas chinesas, vai aguentar o tranco? É uma pergunta que só o tempo vai responder.

O consumidor sai ganhando, mas com responsabilidade

Para quem está pensando em comprar um desses novos modelos, a situação é ao mesmo tempo empolgante e um pouco assustadora. Por um lado, nunca tivemos tanta tecnologia disponível por preços relativamente acessíveis. O MG4 parte de R$ 169.600 com motor traseiro e 204 cv – há alguns anos, um carro com essas características custaria o dobro.

Por outro lado, comprar uma marca nova sempre traz certa insegurança. A revenda vai ser boa? A assistência técnica vai funcionar? As peças vão chegar rápido quando precisar? São questões que pesam na hora da decisão.

Novas opções para o consumidor brasileiro

Uma coisa é certa: a concorrência nunca foi tão acirrada. As montadoras tradicionais terão que correr atrás para não perder mercado. Já estamos vendo isso acontecer – os preços estão ficando mais competitivos, os equipamentos de série aumentando, as garantias se estendendo. No final, quem ganha é o consumidor.

Mas é importante fazer a lição de casa antes de comprar. Visitar a concessionária, verificar a estrutura, conversar com outros proprietários, pesquisar sobre a experiência da marca em outros países. A empolgação com a novidade não pode fazer esquecer o básico: um carro é um investimento de longo prazo.

O futuro: mais marcas a caminho?

Se você acha que seis marcas novas em duas semanas é muito, prepare-se: essa pode ser apenas a primeira leva. Rumores no mercado indicam que outras fabricantes chinesas já estão de olho no Brasil. A Nio, conhecida por sua tecnologia de troca de baterias, e a Xpeng, com seus sistemas de assistência à condução avançados, são nomes que circulam nos corredores do Salão do Automóvel.

Futuras expansões do mercado automotivo

E não são apenas as chinesas que estão de olho nesse movimento. Coreanas e japonesas também devem reagir à invasão. A Hyundai, por exemplo, já anunciou que trará mais modelos elétricos para o Brasil nos próximos meses. A Toyota acelerou seus planos de eletrificação. A Honda está repensando seu posicionamento.

O que me surpreende é como essa transformação está acontecendo mais rápido do que qualquer um poderia prever. Há cinco anos, falar em carros elétricos no Brasil era quase ficção científica. Hoje, temos dezenas de modelos disponíveis ou anunciados. E a tendência é que essa aceleração continue.

O próximo ano promete ser ainda mais movimentado. Com a produção local da Leapmotor na fábrica da Stellantis em Goiana, a expansão das redes de concessionárias e a chegada de novos modelos, 2026 pode marcar a consolidação definitiva dessas marcas no mercado brasileiro. Resta saber quantas delas vingarão e quantas serão apenas passageiras nessa revolução automotiva que estamos testemunhando.

Uma coisa é certa: o mercado automotivo brasileiro nunca mais será o mesmo. A concorrência aumentou, a tecnologia avançou e o consumidor ganhou poder de escolha. Agora é acompanhar para ver como essa história vai se desenrolar nos próximos capítulos.

Com informações do: Quatro Rodas