Um ano pode parecer pouco no mundo da tecnologia, mas para o ecossistema Linux, é tempo suficiente para transformar um hardware promissor em uma máquina significativamente mais eficiente. Uma nova análise do site Phoronix revelou que o processador Intel Core Ultra 9 285K "Arrow Lake" para desktops apresentou um salto de desempenho de até 9% e uma redução notável no consumo de energia quando comparado aos seus resultados de lançamento em outubro de 2024. E o mais interessante? O hardware é exatamente o mesmo.

O que mudou em um ano de testes

A metodologia do Phoronix é o que torna essa comparação tão valiosa. Eles mantiveram a configuração de hardware idêntica: o mesmo Core Ultra 9 285K, a mesma placa-mãe ASUS ROG MAXIMUS Z890 HERO, os mesmos 32 GB de memória DDR5-6400 e a mesma placa de vídeo Radeon RX 7900 GRE. A mágica, portanto, aconteceu toda no software.

Enquanto os testes originais rodavam em Ubuntu 24.04 LTS com o kernel Linux 6.10, a nova bateria foi executada no Ubuntu 25.10, com um kernel Linux 6.18 em desenvolvimento (Git), o compilador GCC 15.2 e a pilha gráfica Mesa 25.2. Essa evolução da pilha de software é a responsável direta pelos ganhos. Mas será que 9% é realmente significativo? Em um processador de alto desempenho, onde cada fração de segundo conta em tarefas pesadas, um ganho bruto de quase um décimo é, sim, algo que se sente na prática.

Gráfico comparativo de desempenho do Intel Core Ultra 9 285K

Ganhos além do desempenho bruto

Os resultados vão muito além de um simples número. O consumo médio de energia da CPU caiu de 136W para aproximadamente 116W, uma redução de cerca de 15%. Isso significa que o processador está entregando mais performance por watt consumido – um sonho para qualquer entusiasta que se preocupa com eficiência energética e temperaturas.

As cargas de trabalho que mais se beneficiaram foram, curiosamente, as relacionadas à web. Benchmarks do Firefox, como Speedometer e Jetstream, mostraram alguns dos maiores saltos. Segundo a análise, isso se deve a uma combinação de otimizações no próprio navegador e, crucialmente, a um trabalho mais refinado do kernel Linux no agendamento dos núcleos de performance (P-cores) e eficiência (E-cores) da arquitetura híbrida do Arrow Lake. O sistema operacional está aprendendo a usar melhor o hardware que tem em mãos.

Gráfico da média geométrica de todos os benchmarks mostrando aumento de 9%

Mas não para por aí. As melhorias se estenderam de forma consistente por uma gama diversa de tarefas: compilação de código, criação de conteúdo, computação de alto desempenho (HPC), codificação de mídia e até mesmo testes de reconhecimento de fala por IA, como o Whisper.cpp. É um avanço generalizado, não um truque pontual em um benchmark específico.

O Phoronix atribui esses ganhos aos "esforços contínuos da Intel Linux" para aprimorar o comportamento do núcleo híbrido e a ferramentas como o Thermald, que gerenciam thermal design power (TDP) de forma mais inteligente. É um trabalho de bastidores, lento e constante, que paga dividendos reais para o usuário final.

Gráfico do consumo de energia da CPU mostrando redução

E o que isso significa na prática, para quem está considerando comprar um? Bem, o preço ainda é uma barreira considerável. Em lojas como a Kabum, o Core Ultra 9 285K é encontrado por valores a partir de R$ 3.200. A pergunta que fica é: vale a pena investir em um hardware de ponta sabendo que seu potencial máximo pode ser desbloqueado apenas com o tempo e a maturidade do software?

Para o usuário Linux, essa análise do Phoronix serve como um poderoso lembrete. A escolha do hardware é apenas metade da equação. A outra metade é a evolução do ecossistema de software que o rodeia – um ecossistema que, no caso do Linux, não para de melhorar e extrair cada vez mais dos componentes. A performance que você compra hoje pode ser, literalmente, apenas o começo.

E essa história de "potencial desbloqueado com o tempo" não é exclusividade do Linux, claro. Mas no mundo do código aberto, o ritmo e a natureza das otimizações têm um sabor diferente. Não se trata apenas de patches de segurança ou correções de bugs críticos que a Intel ou a AMD lançam para seus chips. É algo mais orgânico, mais distribuído. São centenas de desenvolvedores, de diferentes projetos e empresas, mexendo no kernel, nos drivers, nos compiladores, e tudo isso, de forma quase imperceptível, vai lapidando a interação com o hardware.

Pense no kernel Linux como um maestro que está aprendendo a partitura de uma orquestra completamente nova. No lançamento do Arrow Lake, ele sabia os instrumentos que tinha – os P-cores, os E-cores – mas ainda estava descobrindo o melhor momento para cada um entrar, a intensidade certa. Um ano depois, depois de incontáveis ensaios (leia-se: commits de código), a sinfonia soa muito mais harmoniosa e potente. E o melhor: sem trocar um único músico.

O lado B da moeda: a volatilidade do "state of the art"

Mas nem tudo são flores, e é importante ter os pés no chão. Esse cenário também cria uma certa... volatilidade para o usuário de ponta. Você compra o hardware mais recente, instala a última distribuição estável, e pode não estar obtendo a performance pela qual pagou. Na verdade, você está pagando, em parte, por uma promessa. A promessa de que, nas próximas atualizações do kernel, nas próximas versões do Ubuntu ou do Fedora, seu investimento vai render mais.

Isso pode ser frustrante para quem quer o máximo desde o primeiro dia. Já vi fóruns cheios de usuários reclamando de desempenho abaixo do esperado em placas-mãe Z890 com CPUs Arrow Lake, só para descobrirem meses depois que um simples update do microcode da BIOS ou a migração para um kernel mais novo resolvia boa parte dos problemas. É um jogo de paciência. Você está na vanguarda, mas a vanguarda, por definição, é um terreno em constante movimento.

E aí surge uma pergunta interessante: será que, para o usuário comum do Linux, faz mais sentido comprar uma geração anterior, cujo suporte já está maduro e estabilizado? Um Core i9 da 13ª ou 14ª geração, por exemplo, pode oferecer uma experiência mais previsível e otimizada desde o dia zero, muitas vezes por um custo menor. A busca pelo último modelo pode colocar você justamente nesse período de "amadurecimento" do software, onde os ganhos são incrementais, mas os pequenos problemas podem ser mais frequentes.

Não é só a Intel: um ecossistema que aprende junto

É tentador creditar todo o mérito à Intel, e de fato o trabalho deles com os engenheiros do kernel Linux é fundamental. Mas reduzir a história a isso seria um erro. O que o teste do Phoronix realmente demonstra é a robustez de um ecossistema. O GCC, o compilador, melhorou. O Mesa, que cuidade da parte gráfica em ambientes de código aberto, evoluiu. O próprio Firefox foi otimizado.

Essa é uma força única do mundo open source. Uma melhoria em uma ferramenta fundamental, como o compilador, pode reverberar e acelerar milhares de outros programas. Quando o GCC 15.2 gera um código de máquina mais eficiente para a arquitetura Arrow Lake, não é só o benchmark que roda mais rápido; é todo o software que você compila a partir da fonte na sua distribuição. É o servidor que você administra, o banco de dados que processa suas consultas, o software de renderização 3D que você usa para trabalhar.

E isso me leva a um ponto que muitas vezes passa batido: a importância das distribuições "rolling release", como o Arch Linux ou o openSUSE Tumbleweed. Para o usuário que quer estar sempre na crista da onda das otimizações, essas distros são uma escolha quase natural. Elas entregam as últimas versões do kernel, dos drivers e das bibliotecas muito mais rápido que as distribuições de lançamento pontual, como o Ubuntu LTS. O trade-off, claro, é uma estabilidade potencialmente menor. Mas se o seu objetivo é extrair cada último ciclo de clock do seu Core Ultra 9 o quanto antes, pode valer a pena encarar o desafio.

Por outro lado, o Ubuntu 25.10 usado no teste mais recente mostra que mesmo as distros com ciclos mais tradicionais estão absorvendo essas otimizações em um ritmo acelerado. A distância entre o "state of the art" do kernel e o que chega ao usuário final está diminuindo.

E você, já passou por uma experiência assim? Comprou um hardware novo e, depois de alguns meses e várias atualizações, sentiu que o computador estava literalmente mais rápido, sem você ter feito nada além de manter o sistema atualizado? É uma sensação peculiar, quase como se a máquina estivesse amadurecendo, ganhando experiência. Diferente do mundo Windows, onde grandes ganhos de performance geralmente vêm em pacotes de drivers específicos ou em grandes atualizações semestrais, no Linux esse processo é mais contínuo, mais granular.

Olhando para o futuro, isso coloca uma perspectiva fascinante sobre o próximo grande lançamento. A próxima arquitetura da Intel, seja ela qual for, chegará ao mercado com um ecossistema Linux que já tem anos de experiência em lidar com núcleos híbridos, com agendamento inteligente de tarefas e com gerenciamento térmico refinado. O período de "amadurecimento" pode ser cada vez mais curto. A curva de aprendizado do maestro está ficando mais íngreme.

Isso também aumenta a responsabilidade dos revisores de hardware e dos criadores de conteúdo. Um review de lançamento de uma CPU no Linux é, por definição, uma foto instantânea de um processo em movimento. Os números publicados no dia do lançamento são um ponto de partida, não um veredito final. Talvez fosse interessante ver mais sites adotando a prática do Phoronix e revisitando o desempenho após seis meses ou um ano, para dar aos leitores uma visão mais completa do ciclo de vida do produto que estão considerando comprar.

Afinal, quando você gasta mais de três mil reais em um processador, não está comprando apenas silício. Está comprando um ingresso para uma jornada de performance que ainda está sendo escrita – e no Linux, a caneta está nas mãos de uma comunidade global que não para de trabalhar.

Com informações do: Adrenaline