O fenômeno dos jogos não jogados na Steam

Quantos jogos na sua biblioteca da Steam você realmente jogou? E quantos foram comprados e nunca abertos? Essa pergunta aparentemente simples revela um comportamento comum entre os jogadores digitais - e pode ser justamente o segredo do sucesso da plataforma.

Chris Zukowski, especialista em Steam e analista de marketing de jogos, explica em entrevista que muitos usuários da plataforma agem como "colecionadores digitais".

O perfil do colecionador digital

"Um colecionador é alguém que está muito interessado em um assunto e não se preocupa com quanto dinheiro está gastando com isso", afirma Zukowski. Essa mentalidade seria especialmente comum entre os usuários da Steam, que muitas vezes compram jogos movidos pelo impulso ou pela simples satisfação de possuí-los.

Mas por que isso acontece? Algumas possíveis explicações:

  • Promoções frequentes e preços atraentes

  • O desejo de apoiar desenvolvedores independentes

  • A satisfação psicológica de "ter" em vez de "usar"

  • A facilidade de acumular bibliotecas digitais sem ocupar espaço físico

Como a Steam capitaliza esse comportamento

Enquanto serviços como Netflix lutam para manter assinantes engajados, a Steam encontrou uma fórmula diferente. A plataforma não depende necessariamente do tempo que os usuários passam jogando, mas sim do desejo constante de adquirir novos títulos.

Zukowski compara esses compradores a "marinheiros bêbados que gastam dinheiro irresponsavelmente" - uma analogia exagerada, mas que captura a essência do fenômeno. A Steam criou um ecossistema onde comprar jogos pode ser tão satisfatório quanto jogá-los.

O impacto psicológico das bibliotecas digitais

Esse comportamento de acumulação não é exclusivo dos jogos digitais, mas a Steam soube explorá-lo como poucas plataformas. A psicologia por trás disso é fascinante - ter uma biblioteca repleta de jogos não jogados pode criar uma falsa sensação de abundância e possibilidade. É como ter uma estante de livros não lidos, mas com o clique de um botão.

Alguns usuários relatam que apenas navegar por suas bibliotecas já traz satisfação, mesmo sem jogar. "Às vezes passo mais tempo organizando minha coleção do que realmente jogando", admite um usuário no Reddit. Essa dinâmica cria um ciclo peculiar: quanto mais jogos acumulados, maior a sensação de que "há sempre algo para jogar" - mesmo que a maioria nunca seja aberta.

As estratégias da Steam que incentivam a acumulação

A plataforma desenvolveu mecanismos inteligentes que alimentam esse comportamento:

  • Descontos relâmpago: Ofertes por tempo limitado criam urgência artificial

  • Pacotes e bundles: Permitem comprar múltiplos jogos por preços irrecusáveis

  • Recomendações personalizadas: Algoritmos que sugerem jogos baseados em sua biblioteca, não no que você realmente joga

  • Conquistas de colecionador: Badges e status por comprar certos tipos de jogos

E o mais interessante? Muitos desses mecanismos foram refinados ao longo dos anos através de testes A/B e análise de dados. A Valve, empresa por trás da Steam, tem acesso a informações detalhadas sobre padrões de compra e uso - e claramente descobriu que incentivar a acumulação é mais lucrativo do que focar apenas no tempo de jogo.

O paradoxo da escolha na era digital

Ter centenas de jogos à disposição pode ser tão paralisante quanto empolgante. Alguns psicólogos chamam isso de "paradoxo da escolha" - quanto mais opções temos, mais difícil se torna tomar uma decisão. Na prática, muitos jogadores acabam retornando aos mesmos poucos títulos familiares, enquanto a maioria da biblioteca fica esquecida.

Curiosamente, esse fenômeno tem um efeito colateral inesperado: a valorização dos jogos "clássicos" ou "essenciais". Em meio a uma biblioteca superlotada, títulos consagrados como The Witcher 3 ou Portal 2 continuam sendo jogados precisamente porque os jogadores sabem que valem seu tempo limitado.

E você? Já parou para calcular qual porcentagem da sua biblioteca da Steam você realmente explorou? A resposta pode surpreender - ou talvez confirmar que você é parte desse fenômeno global de acumulação digital.

Com informações do: IGN Brasil