O papel crucial do ray tracing na nova era de DOOM

Quando a id Software anunciou DOOM: The Dark Ages, poucos imaginavam o quanto a tecnologia de ray tracing seria fundamental não apenas para os gráficos impressionantes, mas para todo o processo de desenvolvimento. Em entrevista exclusiva ao Digital Foundry, Billy Khan, diretor de tecnologia da engine da id Software, revelou detalhes fascinantes sobre como essa inovação transformou a produção do jogo.

DOOM The Dark Ages

O novo capítulo da franquia, que explora as origens do icônico Doomslayer, apresenta mapas cinco a dez vezes maiores que os de DOOM Eternal. Essa expansão ambiciosa trouxe desafios técnicos significativos, especialmente no que diz respeito à iluminação e ao design de ambientes.

WYSIWYG: A revolução no fluxo de trabalho

Khan explicou que nas engines anteriores, os desenvolvedores trabalhavam com uma representação aproximada da iluminação final. O processo de "baking" de luzes podia levar horas - às vezes até dias - para renderizar completamente uma cena. Com o ray tracing, tudo mudou:

"O ray tracing nos permitiu fazer o que chamamos de WYSIWYG - o que você vê é o que você obtém. Agora podemos visualizar imediatamente como a iluminação se comportará no jogo final."

Ray Tracing DOOM: The Dark Ages

Essa mudança trouxe ganhos de produtividade impressionantes. Durante reuniões criativas, a equipe podia fazer ajustes em tempo real e ver os resultados instantaneamente. Khan relatou que em alguns casos, o tempo de iteração foi reduzido em 10 a 100 vezes em comparação com os métodos tradicionais.

Cutscenes em tempo real e flexibilidade sem precedentes

Um dos benefícios mais notáveis do ray tracing em DOOM: The Dark Ages foi a capacidade de renderizar todas as cutscenes em tempo real. Isso não apenas melhorou a qualidade visual, mas também deu à equipe uma flexibilidade criativa sem precedentes.

"Nós poderíamos até ter uma skin diferente para o Doomslayer, e ela apareceria corretamente em todas as cenas", explicou Khan.

Ray Tracing DOOM: The Dark Ages

Elementos como destruição ambiental e efeitos de gore - marcas registradas da série - ganharam um novo nível de realismo graças ao ray tracing. Khan foi enfático ao afirmar que sem essa tecnologia, o jogo teria levado anos a mais para ser finalizado e não alcançaria o mesmo nível de qualidade visual.

Uma tendência que veio para ficar

A experiência da id Software não é isolada. Grandes estúdios como a Ubisoft também estão relatando ganhos significativos com a adoção do ray tracing. No caso de Assassin's Creed Shadows, a tecnologia evitou dois anos de trabalho dedicados apenas ao "bake" de iluminação.

Com DOOM: The Dark Ages já disponível para PC, Xbox Series X|S e PlayStation 5, os jogadores podem experimentar em primeira mão os resultados dessa revolução tecnológica. A pergunta que fica é: como outras franquias irão se adaptar a esse novo paradigma de desenvolvimento?

O impacto na narrativa e no design de níveis

A adoção do ray tracing não se limitou apenas aos aspectos técnicos - ela transformou profundamente a maneira como a equipe de desenvolvimento abordou a narrativa e o design de níveis. Com a capacidade de visualizar instantaneamente a iluminação final, os designers puderam criar ambientes que contam histórias por si só.

"Antes, tínhamos que confiar muito na intuição e em protótipos rudimentares", revelou um dos level designers do jogo. "Agora, podemos posicionar uma fonte de luz e imediatamente ver como ela molda o clima de uma cena. Isso nos permitiu criar contrastes mais dramáticos entre áreas de segurança e zonas de perigo."

Um exemplo concreto dessa evolução pode ser visto nas masmorras góticas do jogo, onde o jogo de luz e sombras não apenas cria atmosfera, mas também guia sutilmente o jogador. "Em alguns casos, usamos o ray tracing para criar pistas visuais orgânicas", explicou Khan. "Uma fresta de luz indicando uma passagem secreta, ou o reflexo distante de uma arma poderosa - tudo isso funciona de forma mais natural agora."

Desafios técnicos e soluções inovadoras

Apesar dos benefícios, a implementação do ray tracing em larga escala não foi sem obstáculos. Os mapas expansivos de DOOM: The Dark Ages, combinados com a física destrutiva e os sistemas de partículas complexos, criaram situações onde o desempenho poderia ser comprometido.

A equipe desenvolveu várias técnicas para otimizar o processo:

  • Ray Tracing Adaptativo: O jogo ajusta dinamicamente a qualidade do ray tracing com base na complexidade da cena e na distância do jogador

  • Cache de Iluminação Inteligente: Resultados de cálculos de ray tracing são armazenados e reutilizados para cenas estáticas

  • Priorização de Efeitos: Reflexos e sombras recebem mais recursos em cenas de ação intensa, enquanto iluminação global é simplificada

"O maior desafio foi equilibrar qualidade visual e desempenho", admitiu Khan. "Mas descobrimos que em muitos casos, o ray tracing bem implementado pode ser mais eficiente que soluções tradicionais, especialmente em cenas complexas com muitas fontes de luz."

O futuro do desenvolvimento de jogos

A experiência da id Software com DOOM: The Dark Ages levanta questões interessantes sobre o futuro do desenvolvimento de jogos AAA. Com engines cada vez mais capazes de renderizar efeitos complexos em tempo real, o tradicional pipeline de produção - com suas etapas rígidas de pré-renderização - pode estar com os dias contados.

Alguns desenvolvedores já estão explorando possibilidades ainda mais radicais. "Imagine um workflow onde artistas podem pintar com luz como fazem com texturas", sugeriu um técnico de iluminação da equipe. "Ou onde os sistemas de física e iluminação interagem de formas que nem conseguimos prever. Estamos apenas arranhando a superfície do que é possível."

Enquanto isso, a indústria observa atentamente o sucesso técnico de DOOM: The Dark Ages. Vários estúdios já entraram em contato com a id Software para aprender com sua experiência, sugerindo que a abordagem "ray tracing first" pode se tornar o novo padrão para jogos de grande orçamento.

Com informações do: Adrenaline